segunda-feira, 21 de maio de 2012

Conceito e base organizacional do SUAS: uma nova forma de gestão da Política de Assistência Social ou uma reafirmação do processo comprobatório da pobreza?

O Sistema Único de Assistência Social - SUAS é um módulo de gestão que engloba todo o território nacional, que integra os três entes federativos, consolidado um sistema descentralizado e participativo. Desta forma, é um sistema "constituído pelo conjunto de serviços, programas, projetos e benefícios no âmbito da assistência social" (...) e opera a assistência social como política pública, com fundamento constitucional no sistema de seguridade social, não contributiva[1]". (SPOSATI:180:32).
O SUAS (2005) é o desdobramento de uma nova concepção da assistência social, oriunda da Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS - que estabelece as diretrizes da política pública de assistência social como a descentralização político-administrativa para os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, com comando único das ações de cada esfera de governo; a participação popular, por meio das organizações representativas, na formulação das políticas públicas e no controle das ações em todos os níveis; a primazia da responsabilidade do Estado na condução da política da assistência social em todas as esferas de governo. Como destaca Sposati (2006), resignificar a assistência social no campo dos direitos supõe a não-neutralização da potência crítica e simbólica que os demandantes da proteção social possuem e da possibilidade dessa potência ser efetivada como exigência de direitos a efetivas condições para que reelaborem suas condições de existência, colocando-se no centro do conflito social como uma forma alternativa social.
Para além disso, a Lei Orgânica da Assistência Social estabelece, através de seus princípios e objetivos, a assistência social como: direito do cidadão e dever do Estado; a realização da assistência de forma integrada a outras políticas setoriais, a busca da universalização dos direitos sociais, a primazia do Estado na condução da política de assistência; a organização de um sistema de ação descentralizado e participativo e a participação da sociedade civil na formulação e no controle das ações, através do controle social .
De acordo com o exposto acima, pode-se afirmar que a Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS, estabelece uma nova matriz no campo da assistência social, iniciando um processo que tem como perspectiva torná-la acessível e visível como na política pública de direito dos que dela necessitam. Como sinaliza Carvalho (2006), devido ao seu caráter não-contributivo, e seu conteúdo não-mercantil, a cobertura do campo socioassistencial a partir da LOAS visa assegurar a redução ou a eliminação de vulnerabilidades que fragilizam a resistência do cidadão e da família ao processo de exclusão sociocultural, dedicando-se ao fomento das ações impulsionadoras do desenvolvimento de potencialidades essenciais à conquista da autonomia
Essa nova concepção sobre a política de assistência social, vem sendo "desenhada" nas discussões das Conferência Nacionais desde o ano de 1995 e se concretiza com a realização da IV Conferência Nacional da Assistência Social no ano de 2003 onde se deliberou a construção e implementação do Sistema Único de Assistência Social. A partir deste marco, foram estabelecidas as bases para sua implantação em todo o território nacional, de forma a estreitar e fortalecer a relação entre Governo, os Conselhos e a Sociedade Civil.
Como aponta Sposati (2006), a perspectiva do SUAS, ao propor a proteção social básica além da especial, ultrapassa o "caráter compensatório" do entendimento corrente da proteção social provida pela assistência social para via de regra, após a gravidade do risco instalado.
Um dos marcos para a efetivação da assistência social como política pública e o seu desdobramento no Sistema Único da Assistência Social, foi à promulgação da Constituição Federal de 1988 que reconheceu a assistência social como política de responsabilidade do Estado e integrada ao sistema de Seguridade Social no país, junto com a saúde e a Previdência Social.
Com a LOAS, ocorre um avanço em relação à organização, conteúdo, responsabilidades, conferências, diretrizes e princípios da política de assistência que será prestada a quem dela necessitar, se tornava um elenco que contribui para práticas focalizadas naqueles mais necessitados entre os mais necessitados reafirmando o processo comprobatório para a concessão de benefícios.
No artigo 203 da Constituição Federal de 1988, relata-se uma definição dos segmentos sociais aos quais a política de assistência deve atender, restringindo seu significado e suas ações. "A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos: a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; o amparo às crianças e adolescentes carentes; a promoção da integração ao mercado de trabalho; a habitação e a reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária; a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei" (Constituição Federal de 1988, art. 203).
Conforme o entendimento de Sposati (2004), a Assistência Social não é responsável por todas as necessidades desses segmentos, mas também a lei não especifica a quais necessidades ela deve responder. Dessa forma, a política de assistência social fragiliza-se, não havendo uma unidade em suas ações, sendo necessário que construam mecanismos que fortaleçam a política de assistência social como uma política de proteção social.
Vale ressaltar que muitos avanços foram trazidos pela Constituição Federal de 1988 e pela Lei Orgânica da Assistência Social, como a participação popular, o controle social e a descentralização. Ao se tornar uma Política Pública de Seguridade Social, a assistência social avançou como política de garantia de direitos e exige novas formulações para efetivação de sua intervenção.
O avanço da assistência social como política pública, se efetiva de forma regressiva, embora haja avanços na legislação e no perfil institucional de sua gestão. Na Lei existem dispositivos para fazê-lo avançar como política pública, "mas na maioria das ações apresentam-se propostas fragmentadas e compensatórias, fazendo-se necessário que a política de assistência social não deve buscar-se em ações voltadas para a pobreza, e sim entendida como uma política pública de proteção social, direito de todos, visando à universalização do acesso a serviços e a defesa de garantia de direitos". SPOSATI (2006:34).
       Diante do exposto, o Sistema Único de Assistência Social sugere em um momento de preconização das políticas sociais e do corte dos investimentos com elas, tornando-se um desafio para a política de assistência social em reafirmar seu caráter de política, requerendo um questionamento acerca da tradição clientelista e assistencialista que marca a trajetória da assistência social. “O SUAS não é produto do inesperado, da genialidade ou da prepotência da equipe do Governo Federal. Ele resulta de quase 20 anos de luta na assistência social e do aprendizado com a questão da saúde, em particular com o SUS” (SPOSATI, 2006:102).
O processo de descentralização político-administrativa é um processo difícil, complexo e longo, principalmente em uma sociedade historicamente acostumada com manipulações políticas, caracterizando-se em um processo que os resultados afetam em longo prazo. Com a abertura de canais democráticos e a possibilidade de controle social por parte da sociedade civil, a população começa a exercer o controle social, mas muitas vezes esta população desconhece os espaços políticos de participação, como os Conselhos, os Fóruns, as Conferências, que possibilitam uma maior articulação e participação da sociedade civil junto ao governo, sendo esta uma característica recente da história das políticas públicas reforçadas com o Sistema Único de Assistência Social.
De acordo com o entendimento de Sposati (2004), o SUAS trata das condições para a extensa e universalização da proteção social aos brasileiros através da política de assistência social e para a organização, responsabilidades e funcionamento de seus serviços e benefícios nas três instâncias de gestão governamental.


[1]    Ver SPOSATI, Aldaíza. “O primeiro ano do Sistema Único de Assistência Social". In: Serviço Social e Sociedade, nº. 87. São Paulo: Cortez, 2006.
Extraído de : "A territorialidade e a implementação do Sistema Único de Assistência Social no Município de Niterói".

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